bandeira vermelha sinalizando praia imprópria para banho em Salvador

Bandeira vermelha

Em meio à paralisação dos salva-vidas, Salvador já tem nove óbitos por afogamento em 2024

 

Alan Pinheiro (@pinheiro.alann) e Pedro Carreiro (@peucarreiro)

 

Cauã André Ribeiro tinha 15 anos quando desapareceu em meio às águas da praia de Stella Maris no dia 20 de novembro e foi encontrado 48 horas depois, já sem vida. Não havia salva-vidas no posto mais próximo no momento de seu afogamento em razão da  paralisação da categoria. Sem os profissionais, Salvador pode terminar 2024 com um aumento no número de casos de afogamentos fatais em relação ao ano anterior.

 

Os salva-vidas da capital baiana, que somam 249 profissionais divididos em turnos alternados, estão em protesto contra a Prefeitura desde o dia 14 de novembro. Até o momento de apuração da reportagem, a categoria se reuniu em oito assembleias setoriais, através da Associação Baiana de Salvamento Aquático (Abasa), para deliberar sobre melhores condições de trabalho. 

 

Com 106 membros acima de 50 anos, a categoria alega falta de estrutura mínima nos postos, como banheiros, locais para alimentação e equipamentos adequados para o exercício da profissão. A associação pede pela melhoria da infraestrutura e dos equipamentos, além da abertura de um novo concurso público.

 

O coordenador da Abasa, Pedro Barretto, negou se tratar de greve, mas uma recusa em trabalhar nas condições atuais, limitando-se a rondas preventivas. Segundo o profissional, a Salvamar, instituição vinculada à Secretaria Municipal de Ordem Pública (Semop), se encontra abandonada há pelo menos uma década.

 

“As condições atuais são deploráveis. Os tubos de resgate (boias) são usados por muito mais tempo do que o recomendado. As pranchas sempre são compradas em número inferior aos postos de salvamento e também sofrem sem manutenção adequada. Diversas vezes são pranchas velhas, com avarias, que podem machucar socorristas e as vítimas atendidas por eles”, afirma. 

 

Postos de trabalho dos salva-vidas no trecho entre a Praia do Corsário e Jaguaribe. Fotos: Pedro Barreto

 

“A Salvamar onde já chegou a armar até 52 postos, hoje não arma 25 e nenhum deles reúne condições de higiene e segurança em conformidade com a lei e com as normas regulamentadoras”, complementa Pedro Barretto.

 

Em contato com a Semop, a secretaria afirmou estar “investindo em capacitação técnica, ações educativas e modernização da estrutura da Salvamar”. Ainda segundo a nota, 40 pranchas, 30 flutuadores e 216 nadadeiras estão em processo de aquisição, além de três novos postos de trabalho entre o bairro da Boca do Rio e Patamares.

 

Caso as negociações com os salva-vidas não tenham sucesso e terminem em estado de greve, a Semop informou que possui um plano de contingência para paralisações. Um efetivo extraordinário será mantido nos finais de semana, com 10 a 12 postos ativados em pontos estratégicos. A secretaria não informou onde estão localizados os postos citados.

 

 A Abasa também teve participação no texto do PL 1476/2023, projeto que segue para aprovação na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado e dispõe sobre o exercício da atividade profissional de salva-vidas ou guarda-vidas. Ou seja, o projeto de autoria do deputado Léo Prates (PDT-BA), visa a regulamentação da profissão. 

 

Atualmente, o projeto segue aguardando designação de relator(a) na CCJ. Para virar lei, precisa ser aprovado pela Câmara e pelo Senado. Antes, um projeto para regulamentação da profissão do salva-vidas chegou a ser aprovado pela Câmara e por uma comissão do Senado (PLC 42/2013), mas terminou arquivado no final de 2022.

 

Texto do PL 1476/2023

 

Maré de afogamentos

Antes de desaparecer, Cauã Ribeiro estava acompanhado por duas amigas. Além do adolescente, a dupla também se afogou na praia, mas foram socorridas a tempo por populares. Com a morte confirmada, Salvador chegou ao nono caso de afogamento fatal em 2024, contra 10 no ano anterior. 

 

Neste ano, foram oito óbitos registrados entre o Jardim de Alah e o Kartódromo de Ipitanga, área de cobertura da Salvamar. O ano anterior registrou o mesmo número de afogamentos fatais. Fora dos trechos atendidos pelo órgão, quem atende aos chamados é o Grupamento Marítimo (Gmar), do Corpo de Bombeiros. Houve apenas um caso este ano fora da área de atuação da Salvamar, contra dois em 2023.

 

Antes de desaparecer, Cauã Ribeiro estava acompanhado por duas amigas. Além do adolescente, a dupla também se afogou na praia, mas foram socorridas a tempo por populares. Com a morte confirmada, Salvador chegou ao nono caso de afogamento fatal em 2024, contra 10 no ano anterior.

 

Trecho de atuação da Salvamar. Elaborado pelos autores

 

Apesar das mortes, o maior número de afogamentos não é fatal. De acordo com dados divulgados pela Semop, entre janeiro e 23 de outubro de 2024, foram registrados 593 casos de afogamentos. No mesmo período, em 2023, 1.047 casos foram contabilizados, representando uma queda de 43,4%.

 

A maior redução foi observada nos meses de janeiro e fevereiro, tradicionalmente marcados pelo aumento do fluxo de banhistas. Em janeiro deste ano, foram 86 ocorrências, contra 165 no ano passado. Já em fevereiro, os números caíram de 133 para 69.

 

Gráficos de barras com comparativo de ocorrências registradas pela Salvamar entre 2024 e 2023. Elaborado pelos autores.

 

Segundo o secretário da Semop Alexandre Tinoco, a redução dos afogamentos reflete o esforço contínuo das equipes e o investimento em ações educativas e de prevenção. “Nosso objetivo é salvar vidas e tornar as praias de Salvador cada vez mais seguras para todos. Estamos trabalhando para que esses números continuem caindo”, destacou.

 

Para o salva-vidas Diego Antônio Nascimento, a falta de ensino à população sobre os perigos que as praias oferecem é um dos fatores que pode influenciar no aumento de casos de afogamento. Até o dia 13 de novembro de 2024, as equipes da Salvamar realizaram 97 palestras e eventos educativos para conscientizar banhistas sobre os cuidados no mar. A quantidade de eventos diminuiu em 47% em relação ao ano anterior, onde houve a realização de 183 atividades educativas.

 

O trabalho inclui a distribuição de 4.981 pulseiras de identificação para crianças, ajudando a evitar situações de risco, como perdas ou acidentes. 55 crianças que se perderam nas praias foram localizadas e devolvidas aos responsáveis pelos salva-vidas em 2024.

 

Para tomar cuidado

O fator mais determinante para a incidência de afogamentos é a presença das correntes de retorno na praia, que podem ser fixas (como nas praias que possuem pedras e rochedos) ou móveis. Quem afirma é o oceanógrafo André Quadros, que também alerta para mudanças sazonais.

 

“Essas correntes são o retorno do fluxo de água acumulado próximo à praia em direção ao mar. Elas possuem algumas características que ajudam a identificá-las, como a ausência de ondas e coloração diferente. (…) Com a chegada do outono-inverno e até o início da primavera, temos ventos mais fortes e ondas maiores”, explica.

 

Segundo André, em toda praia existe o risco de afogamento, assim como em lagos, rios e piscinas. Ao se preparar para tomar um banho no mar, o banhista precisa estar atento às características de cada praia, como a exposição ao vento e a ação das ondas. As praias do farol de Itapuã, Stella Maris, praia do Flamengo e jardim de Alah foram citadas como exemplos de cautela aos  banhistas por conta de suas  características morfológicas.

 

Caso o banhista chegue a uma praia que não conhece, o profissional sugere que o cidadão procure um posto salva-vidas para obter orientações. Outra ação é prestar atenção nas placas informativas e nas bandeiras de sinalização das praias. Essas bandeiras indicam o nível de risco.

 

Slide com significados das bandeiras. Ilustrações: Maria Luísa Carreiro

 

“É fundamental prestar atenção nessa sinalização e nunca entrar no mar em locais que tenham a presença da bandeira vermelha. Elas normalmente estão colocadas em frente ao local de maior risco. Caso decida entrar no mar, a linha da água não deve passar das pernas”, diz. 

 

A instrução do Salva-vidas Diego Antônio Nascimento é de que o banhista em situação de afogamento grite por socorro, levantando as mãos e acenando para que alguém possa visualizar com facilidade. Também é importante não nadar contra a corrente de retorno, para que se preserve energia e oxigênio, o que contribui para o afogado permanecer mais tempo na superfície.

 

Em referência ao que fazer ao avistar uma pessoa se afogando, o salva-vidas sugere que se procure imediatamente um profissional qualificado para realizar o resgate. Na falta do agente, tentar chamar atenção de um surfista e ligar para os órgãos responsáveis por esse tipo de serviço.

 

Para que o morador de Salvador ou o turista não tenha problemas com o banho no mar, a Salvamar também reforça para que o banhista não entre no mar após o consumo de bebidas alcoólicas, evite áreas de correnteza e preste atenção às orientações dos salva-vidas.

 

Em caso de emergência, basta acionar os agentes de salvamento aquático ou ligar para o número (71) 3363-5333. Nas praias fora do raio de atuação da Salvamar, o contato deverá ser feito com o Gmar, no número 193.

 


Alan Pinheiro é estudante de Jornalismo na Universidade Federal da Bahia (UFBA) e repórter de esporte no Correio.

 

Pedro Carreiro é estudante de Jornalismo na Universidade Federal da Bahia e repórter estagiário de esporte no MASSA!

 

O tema de afogamentos em Salvador foi escolhido pela relevância do assunto próximo à temporada de férias e a grande relevância do tema para moradores da cidade e turistas que chegam à capital baiana.

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