Ponto da FACED também sofreu com corte de linhas de ônibus

Cortes de linhas de ônibus em Salvador mobilizam UFBA

Estudantes da Faculdade de Direito enfrentam desafios com redução na frota rodoviária e articulam petição para criação de nova rota integrada

 

Lucas Ramos


Diariamente, o estudante de Humanidades Guilherme Roza, 21, se depara com o desafio de encarar uma jornada de quase três horas para chegar à UFBA, no campus localizado no bairro da Graça, em Salvador. Morador de Simões Filho, na Região Metropolitana, ele depende de uma combinação de ônibus, metrô e BRT para cumprir um trajeto que antes era feito em um único transporte. As dificuldades começaram após mudanças na malha rodoviária da capital, que alteraram drasticamente as linhas que conectam os municípios vizinhos.


“Antes, eu pegava um único ônibus para ir da minha cidade até a Pituba. Agora, preciso pegar um ônibus para Águas Claras ou para a Estação Aeroporto, depois atravesso Salvador de metrô, e ainda outro ônibus ou o BRT. Isso triplicou o tempo de deslocamento”, afirma Guilherme. Mesmo com o desconto da passagem universitária e divergências quanto a integração dos cartões de transporte de Simões Filho e Salvador, o estudante aponta que os custos podem ficar maiores, e atrasos em qualquer ponto do percurso podem afetar toda a rotina. “Se eu perder o ônibus na minha cidade por cinco minutos, é uma hora de atraso no mínimo. Qualquer problema no metrô ou no ônibus só piora a situação.”

Essa é uma realidade não apenas de Guilherme, mas também de muitos moradores da Região Metropolitana e da própria capital que trabalham ou estudam em pontos distantes e que requerem acesso e melhor integração para a garantia de uma boa viagem. Para eles, os cortes de linhas de ônibus transformaram trajetos já desafiadores em uma experiência ainda mais desgastante e demorada.


Estudos apontam que a capital baiana perdeu 134 linhas de ônibus nos últimos 4 anos, como apontado por Organizações da sociedade civil de Salvador, além da reformulação e ampliação da frota, que também teria perdido cerca de 700 veículos ao longo de 10 anos, atingindo principalmente bairros na periferia da cidade. Estima-se que, entre os motivos para o corte esteja a adesão a outros sistemas de transporte, como o BRT, que vem expandindo seus destinos.

Segundo o co-coordenador do Observatório de Mobilidade de Salvador, Lucas Vinícius Lopez Araújo, 24, esse é um projeto pontual da prefeitura para reformular o funcionamento e logística das linhas. “A prefeitura falava que quanto mais linhas específicas que conectam bairros existem, menor é o número da frota. Por isso, criaram um sistema tronco alimentador, de integração através do cartão de transporte, de forma que as linhas de bairro tem como destino final os terminais mais próximos, para que o tempo de espera seja reduzido, o que não aconteceu”, diz.

De acordo com uma pesquisa realizada pela Moovit em 2022, a primeira capital do Brasil é também a terceira grande cidade com o maior tempo de espera entre as viagens de ônibus, empatada com Brasília. O tempo de todo esse processo prejudica não apenas estudantes, mas também pessoas que utilizam o transporte público para afazeres de rotina, como consultas médicas e demais viagens frequentes, além do percurso de trabalho.

 

Faculdade de Direito da UFBA, localizada na Rua da Paz, s/n, Graça – Foto: Lucas Ramos


“A redução na frota atinge diretamente estudantes e já foi percebida pela UFBA.”


Identificando a alta na demanda de acesso à universidade e as dificuldades pelo caminho, o Centro Acadêmico Ruy Barbosa (CARB), da Faculdade de Direito da UFBA, iniciou a articulação de uma petição à Secretaria de Mobilidade de Salvador (Semob), em dezembro de 2023, para a possível criação de uma nova linha que atenda a rota dos demais estudantes.

“Já era difícil porque só temos uma linha que passa perto da faculdade, e mesmo assim a parada fica em um lugar perigoso, onde quase todo dia tem relatos de assaltos”, afirma Luiz Gustavo de Azevedo Capinam, 25, acadêmico de Direito e representante do CARB. Segundo ele, a redução na quantidade de ônibus disponíveis nas rotas existentes só agravou a situação. “Esperar por um ônibus que antes vinha em cinco minutos e agora leva muito mais tempo tem prejudicado todos os estudantes, principalmente os que moram longe.”


Tanto para Luiz quanto para Lucas, a intenção da prefeitura não é apenas um corte de gastos. Junto à falta de subsídios dedicados especificamente para o transporte público, há também uma estratégia para estimular novos hábitos na malha de transportes da população, no que diz respeito à inclusão do metrô e do BRT no percurso diário.

 

 

A proposta de uma nova linha de ônibus que atenda à Faculdade de Direito é um sonho antigo dos alunos. “Hoje, com as políticas afirmativas, o perfil do estudante mudou. Cerca de 80% das pessoas que frequentam a faculdade dependem do transporte público”, explica o representante do CARB. A mobilização, iniciada como parte de uma campanha eleitoral para o Centro Acadêmico, cresceu ao longo da última gestão e ganhou força entre os estudantes e a comunidade acadêmica. “Esperamos que a Secretaria de Mobilidade entenda a urgência dessa demanda e tome medidas que realmente atendam à nossa realidade.”

Atualmente, três linhas de ônibus que saem da Estação da Lapa incluem o ponto de ônibus do campus Canela na rota, o 0137 – Lapa x Barra, 0140 – Lapa x Rio Vermelho e 0142 – Vale do Canela x Lapa, tanto pelo acesso da Rua Padre Feijó, através da Creche UFBA, quanto pela Avenida Miguel Calmon, na entrada principal da Faculdade de Educação (Faced) e da Escola de Administração. Os estudantes que optam pela entrada da Faculdade de Direito percorrem um caminho ainda mais longo, deslocando-se em paradas nas avenidas Euclydes da Cunha e Princesa Leopoldina, já na Graça.


Na relação com as linhas do Busufba, transporte disponibilizado pela universidade para a circulação entre os campi, apenas um inclui Faculdade de Direito no roteiro: o B3. As demais opções apenas passam pela Creche ou pela avenida Euclydes da Cunha, na parada de acesso à Residência Universitária 3, na esquina com a Rua Barão de Loreto.


Acho que existe um pouco mais do que questões financeiras, é um plano político da própria prefeitura.”

 

A ideia do CARB é criar uma nova rota no sistema de integração que contempla parte desses trechos, partindo da Lapa e percorrendo os bairros de Politeama de cima, seguindo para o Campo Grande, passando pela Reitora da UFBA até o bairro da Graça, conforme a rota do B3, que chega até o Vale do Canela.

 

O estudante Luiz Gustavo de Azevedo Capinam, na sede do Centro Acadêmico Ruy Barbosa (CARB). – Foto: Lucas Ramos

 

Com a recente adesão dos micro-ônibus nas rotas do sistema de transporte público soteropolitano, os integrantes da instância levantaram a possibilidade inédita da possível circulação do veículo como uma alternativa viável para acessar a Faculdade de Direito, localizada em uma ladeira de acesso estreito na esquina da Rua da Paz com a Rua Conde Filho, na Graça. Após realizarem um abaixo-assinado com o corpo estudantil da faculdade, levaram a proposta até o Coordenador de Planejamento de Transportes da Semob, Raimundo Dortas.

Ele achou uma ideia ótima e basicamente disse: ‘Olha, a gente não pode fazer isso agora, porque a gente não tem nem ônibus para circular. Mas a gente promete que dá uma olhada.’, conta Luiz. “A gente [CARB] ‘tá’ vendo isso com olhos muito positivos… e a possibilidade que isso saia do papel é grande, né? Temos alguns professores que querem nos ajudar e esse apoio é muito importante.” O centro acadêmico segue em contato com a Semob para a estruturação e avanço da petição.

 

 

*A reportagem procurou a Secretaria de Mobilidade de Salvador para obter esclarecimentos sobre a mobilização e a petição pela criação da nova linha, assim como a PROAE-UFBA, responsável pela operação dos Busufbas, para compreender o posicionamento diante da situação. Até o fechamento desta matéria, não houve retorno de ambas as instituições. O espaço permanece aberto para manifestações futuras.

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Lucas Ramos é bacharel em Humanidades e estudante de Jornalismo pela Universidade Federal da Bahia. É estrategista de conteúdo no Grupo Caffeine Army e tem experiência com social media. A motivação pela matéria se deu pela precarização constante na malha rodoviária de Salvador em diferentes escalas, em conforme com as cortes de investimentos da UFBA.

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