A moda circular e a tendência do reuso que conquista corações e guarda-roupas revelam busca por consumo mais consciente
Damilla Carmo (@damillacarmo) e Kauane Brito (@kauanebbrito)
Em Salvador, as araras dos brechós estão mais cheias do que nunca. O que antes era uma alternativa para quem buscava roupas a preços acessíveis, agora se tornou um movimento que ganha cada vez mais força. Mas o que está por trás desse fenômeno? É a busca por um consumo mais consciente, impulsionada por movimentos como o slow fashion e a valorização da sustentabilidade, ou simplesmente uma nova onda das redes sociais?
A moda do reuso, antes restrita a um público específico, agora conquista diferentes perfis de consumidores. Essa popularidade dos brechós em Salvador reflete uma mudança na forma como as pessoas se relacionam com a moda. A fast fashion, com sua produção em massa e descarte rápido, cede espaço para um o slow fashion, modelo de consumo mais circular no qual as peças são reutilizadas por mais tempo, dando espaço para a sustentabilidade, como explica a designer de moda, Cllaudia Soares.
“As tendências estão direcionadas para os elementos que estejam comprometidos com o conforto, tecidos que tenham pelo menos 75% de fibras naturais. As grandes plataformas de moda brasileiras, como a Sou de algodão e Nordestesse, propõem em seus eventos, criadores engajados com a responsabilidade e sustentabilidade no desenvolvimento de seus designs. Essas propostas envolvem também a reciclagem de produtos do vestuário, ressignificando-os.”
Além disso, as redes sociais parecem desempenhar um papel importante na popularização dos brechós. Hashtags como #brechó e #slowfashion criaram verdadeiras comunidades online, onde pessoas compartilham seus achados. A possibilidade de encontrar peças únicas, que carregam histórias, com preços acessíveis, aliada à busca por uma identidade pessoal, torna os brechós ainda mais atraentes.
O que torna um brechó um sucesso?
A resposta para essa pergunta vai além da oferta de peças usadas. A experiência do consumidor, a curadoria das peças, a localização e a comunicação são alguns dos fatores que podem ditar o sucesso de um brechó.
A curadoria das peças é um fator que se destaca. Selecionar peças de qualidade, em bom estado de conservação, é uma estratégia interessante para garantir a satisfação dos clientes. Além disso, organizar o espaço, expor e categorizar as peças, facilitam a experiência de compra e contribuem para a boa imagem de um brechó.
A Humana Brasil é um exemplo de um brechó de sucesso com uma proposta de moda sustentável e preços acessíveis. A loja tem três unidades espalhadas por Salvador e trabalha com variedade de peças e experiência de compra única, já que os preços variam a cada três semanas, incentivando a rotatividade e a visita periódica dos clientes.
“O público-alvo das lojas Humana Brasil é composto por pessoas que querem contribuir para um planeta mais sustentável e igualitário, através do consumo consciente. Também temos um público de pequenos empreendedores, que compram para revender em seus brechós”, destaca Iranir Santos, gerente geral das Lojas Humana.
O relacionamento com público é fundamental para o sucesso de qualquer empreendimento. Nas redes sociais, os brechós encontram um terreno fértil para mostrar que é possível ter um guarda-roupa personalizado e, ao mesmo tempo, contribuir para um futuro mais sustentável. Brechós como a Humana Brasil utilizam as plataformas digitais para mostrar que é possível encontrar peças únicas sem abrir mão da consciência ambiental.
“As redes sociais têm um papel fundamental na formação da percepção das pessoas sobre a moda circular. Nas nossas redes sociais (@lojahumanabrasil), compartilhamos looks criativos, estilosos e atuais, produzidos por nossa equipe, com peças encontradas nas lojas Humana dos bairros da Piedade, Itapuã e Uruguai. Os conteúdos que postamos nas redes sociais ajudam a combater os preconceitos em relação às roupas de segunda mão e as pessoas percebem que nos brechós elas encontram peças de grandes marcas, com preços acessíveis e excelente qualidade”, completa Iranir.
Ver esta publicação no Instagram
Como as redes sociais estão transformando o mercado de brechós
É fato: as redes sociais transformaram a relação com a moda. Plataformas como Instagram e TikTok se tornaram verdadeiras vitrines para que as tendências alcancem um público muito maior e diversificado. No caso dos brechós, elas permitem um contato direto com os clientes, publicação de novas peças e divulgação das ações especiais de promoção. Essa interação próxima com o público fortalece o relacionamento e cria consumidores fieis.
Na mesma via, os influenciadores digitais também têm um papel fundamental na popularização dos brechós com os famosos vídeos de achados e provadores.
Juliana Macedo, também conhecida como @afrojuli , influenciadora digital de apenas 18 anos com mais de 60 mil seguidores no TikTok, tem se destacado por promover o consumo consciente e a moda circular em Salvador. Em uma conversa sobre o impacto dos brechós na vida dos soteropolitanos, ela compartilhou suas reflexões e experiências pessoais, que refletem as mudanças no comportamento de consumo, especialmente entre os jovens.
Segundo Juliana, a influência das redes sociais foi crucial para desmistificar os brechós. “Os influencers têm ajudado muito na admissão do brechó em nossas vidas. Com seus baixos preços e peças tão diferentes, muita gente que antes nem conhecia ou tinha preconceito, começou a enxergar os brechós de outra forma. Existe essa ideia enraizada de que brechó é só para quem é pobre, e isso precisa mudar.”
A influenciadora revela que visitar brechós faz parte de sua rotina. “Sempre que possível, vou ao brechó para procurar peças novas e renovar o armário. É um processo divertido e sustentável.” Ela tem um carinho especial pelos brechós do final de linha da Barroquinha, conhecidos pela variedade e pela concentração de estabelecimentos. “Sempre frequento os de lá. Tem vários um do lado do outro, e sempre encontro algo incrível.”
Para Juliana, os brechós vão além de oferecer roupas; eles proporcionam acesso a peças que são tendências no mundo da moda, mesmo para quem tem um orçamento limitado. “Além de movimentar o comércio local, você tem a oportunidade de ter peças consideradas caras, por estarem na moda, sem precisar de muito dinheiro. Isso desmente o mito de que para ser estiloso é preciso ser rico.”
Juliana destaca que os preços das roupas em lojas de departamento são um dos fatores que têm levado a explorar o universo dos brechós. “Os preços absurdos nas lojas de departamento fazem com que a gente busque alternativas mais acessíveis. Nos brechós, você encontra roupas vintage, bem conservadas e com preços justos.” Essa percepção tem impulsionado a popularidade desses estabelecimentos, que oferecem não apenas economia, mas também peças diferenciadas.
No entanto, ela ressalta que ainda há desafios a serem superados, especialmente em relação à divulgação desses espaços. “Acredito que a maior dificuldade seja a divulgação da localização dos brechós em Salvador. Muita gente tem o desejo de começar nessa vida de garimpo, mas não sabe onde ficam.”
Com suas palavras, Juliana Macedo inspira uma nova geração a abraçar a moda circular, promovendo não só sustentabilidade, mas também um olhar mais consciente sobre o consumo. A jovem mostra que estilo e responsabilidade podem andar lado a lado, transformando o ato de comprar em uma experiência cheia de significado.
O futuro da moda passa pelos brechós
A moda circular é um conceito que vem ganhando força. A ideia é pensar em uma produção e um consumo mais sustentável, em que as roupas tenham um ciclo de vida mais longo. Segundo pesquisa do Sebrae, uma roupa de segunda mão pode emitir até 82% menos carbono do que um item novo.
Os brechós são produtos desse modelo já que promovem a reutilização de peças e contribuem para reduzir o impacto ambiental da indústria da moda. Os dados do Sebrae revelam um cenário promissor para o mercado de segunda mão. Apenas entre 2010 e 2015, houve um crescimento exponencial de 210% nos brechós e na venda de roupas usadas, demonstrando a crescente demanda por um consumo mais consciente.
Os brechós, antes vistos como locais para encontrar peças antigas, agora são conhecidos por oferecerem opções mais acessíveis, contribuindo para a construção de uma moda mais consciente e circular, transformando, inclusive, o perfil do público, como indica Cllaudia Soares.
“Fundamentais também na mudança de comportamento do consumidor. Os brechós podem formar um público de personalidade, e identidade própria, que gosta de garimpar peças que componham e adornem bem o seu estilo”, afirma a especialista em moda.

A diversidade por trás da tendência: quem compra nos brechós?
O universo dos brechós, antes restrito a um público específico, hoje abrange uma diversidade de perfis. Mas quem são essas pessoas que buscam as araras dos brechós? Com base na pesquisa da Revista Brasileira de Pesquisas e Marketing, Opinião e Mídia (PMKT) sobre o perfil dos consumidores cariocas de brechós , foi possível destacar algumas características gerais do público eclético que são adeptos à tendência.
- Jovens em busca de autenticidade: a geração Z gosta da característica de ser único. Com os brechós, eles podem construir um guarda-roupa autêntico e original, com peças que ninguém mais tem.
- Consumidores conscientes: pessoas que buscam alternativas mais sustentáveis na moda conseguem comprar peças de segunda mão nos brechós e contribuir para com a redução do consumo e do uso dos recursos naturais.
- Adeptos do vintage: aqueles que gostam do design atemporal e de se vestirem com peças que carregam histórias.
- Caçadores de achadinhos: os brechós são ótimas opções de encontrar peças de qualidade e no precinho. Essa é uma oportunidade para quem quer renovar o guarda-roupa sem gastar muito.
- Influenciadores digitais: os brechós também são preferidos pelos influenciadores digitais, que utilizam as redes sociais para mostrar os garimpos e indicar as lojas aos seguidores.
Mapa dos Brechós: descubra o brechó perfeito para você
Para facilitar a vida dos amantes de brechós, nada melhor do que um mapa interativo com a localização dos principais brechós de Salvador. Nele, é possível encontrar informações sobre cada estabelecimento. Com o mapa, você pode explorar os diferentes brechós da capital baiana e encontrar aquele que mais combina com o seu estilo e suas necessidades.
___
Damilla Carmo é estudante de Jornalismo na Universidade Federal da Bahia (UFBA), apaixonada por moda, jornalismo digital e cinema. Acompanha de perto os principais lançamentos da sétima arte e atua como estgiária na Braskem, onde contribui com projetos de impacto social.
Kauane Brito é estudante de Jornalismo na Universidade Federal da Bahia (UFBA), atua como repórter na TVE Bahia e como assessora de imprensa na Berradêro Comunicação. Ama explorar a comunicação em todas as suas possibilidades.
O interesse pela pauta surgiu a partir de uma inquietação da dupla ao observar o renascimento dos brechós, que ganha força em todo o mundo e encontra em Salvador um terreno fértil. A pauta busca entender se esse movimento se dá pelas tendências das redes sociais ou pela busca por alternativas de consumo mais sustentáveis. Além de mapear os brechós da cidade para facilitar o acesso dos consumidores, promovendo a cultura dos brechós na cidade.